10.4.16

QUANDO EINSTEN LAMBIA OS BEIÇOS



cozinhar era a nossa especialidade
a começar pelo crânio azul de lieko shiga
recordo dos jantares no palco de newton
que apelidamos de “caldeirão do cosmos”
quando reduzíamos a gravidade
e o assado espaço-tempo crescia tão bem
um padrão que será difícil alguém superar
nossas sobremesas também eram imbatíveis
einstein nunca enjoou delas
e mal sabia que o segredo era a supersimetria do açúcar
naqueles dias roíamos as unhas até gastar os dentes
usávamos vermes do japão em nossas tristes camisetas
e dos jantares só nos restou a teoria das cordas
tão elegante quanto greene aos domingos

23.3.16

LUÍS XIV NA REVISTA PIOLHO




LUÍS XIV


lembro-me dos teus pés
uma gritaria assoviada
um impacto de corpos celestes
perfurando as camadas congeladas da memória
lembro-me dos teus pés
e dos teus extravagantes sapatos topografando as esquinas
desviando grandes rotas
lembro-me dos teus pés
dos planetas não explorados
e do plutão vermelho que carregava na boca
te apelidei de luís xiv
por isso resisto caminhar descalço
resisto às guerras ganhas
resisto às mentes sem trajetória
ouvi dizer que teus pés descascavam |eu mesmo disse|
a desidratação não era a causa mais provável
a causa mais provável era a falta de histórias
histórias aplacam sofrimentos morais
te apelidei de luís xiv e nem salto você usava
pensei em açougueiro egípcio
só eles usavam plataformas para manter os pés longe da sujeira
você era sujo, definitivamente sujo
era um ser fictício
igual aos pastéis de feira em dias de domingo
lembro-me dos teus pés
atravessando o percurso entre o ponto |a| e o ponto |b|
a água do mar encobria tua imagem
estourando em bolhas teus lábios molhados
lembro-me dos teus pés
depois de anos sem ouvir teus passos
meus punhos ainda pronunciam teu nome
nevando minhas noites apócrifas
lembro-me dos teus pés
entretanto a cosmofísica não explica as cavidades
subcutâneas das minhas lembranças
desde o rebaixamento de plutão
o sistema solar passou a ter oito planetas
não obstante a suposta existência dos teus pés
tuas órbitas estranhamente alongadas
teu salto alto e os 4,48 bilhões de quilômetros de distância do sol 
podem mudar essa história
lembro-me dos teus pés
e das caixas de salto alto científicas
não percebemos os 1.400 anos-luz de distância do solo
a gravidade nunca te equalizou e sobre teus dedinhos
minha língua insinua mentiras
lembro-me dos teus pés
do esforço para manter o equilíbrio
dos abismos que construía entre o estômago da lua
e dos velhos poemas à beira-mar
naquelas tardes pedia-me asas
|órgão do voo dos poetas e dos lunáticos|
lembro-me dos teus pés
da sacra histeria
da deliciosa indecência
e da equação que fazia tentando arrancar o corpo do chão
|a extremidade dos membros inferiores me assusta|
lembro-me dos teus pés
enterrados nos olhos
revelando a beleza da pura filosofia
dreams of a final theory
lembro-me dos teus pés

porque de você, luís xiv, eu não lembro 

26.7.15

ISTO NÃO É SOBRE UM SISO



sob este imenso céu de azul nietzschiano
minha barba enrosca no siso extraído
procuro mudar o sentido da chuva
pendurar as gotículas à beira da luz
entretanto não posso
tivesse gritado ou atado o diálogo ao beijo
absolutamente de nada adiantaria 
lembro do sexo com sabor empírico
abissal lembrança de nós dois
como mármore sua barba não gruda
a minha escorre ácida pelo peito
até a linguagem dou por desconhecida
um estrangeiro de eleia na luta infinita

3.3.15

UM CONTO


Edição da Um Conto - Revista de Literatura que colaborei em 2012. Projeto muito bonito!

Um Conto – Revista de Literatura foi criada em 2011 visando a publicação, em meio físico, de poetas, ilustradores e contistas ainda não descobertos pelo mercado editorial. Pelo seu caráter colaborativo, torna-se um eficaz veículo de publicação de novos autores, de forma independente e criativa.  Hoje, no entanto, a revista se apresenta como um espaço físico e virtual aberto à colaboração tanto de novos como de artistas já conhecidos pelo grande público.
As edições físicas, ultimamente, não possuem periodicidade fixa e seguem o mesmo formato inicial: uma folha A4 em 3 dobras centrais contendo 5 poemas, 1 ilustração e um conto. Recebemos colaborações no endereço revistaumconto@gmail.com, podendo estas aparecer tanto em algum número da revista quanto nas postagens do blog.

AMOR GALÁCTICO

ei netuno,
preciso te dizer que fiz uma cirurgia
nada tão complicado
 
até parecia fácil olhando os médicos me cortarem
na real, eu nem olhei nada - tomei anestesia
mas soube que não era grave
e que o pedaço que tiraram de mim
 já foi descartado
parece que algo não prestava ou fazia mal
talvez tenha sido um dos teus diamantes que comi
ei netuno,
o que preciso mesmo dizer
é que o pedaço que falta em mim é você
não aquele apêndice infeccionado
mas você inteiro, volta pra terra, volta
são apenas 4 bilhões de quilômetros que nos separam
não quero te perder novamente
nos últimas dias tenho andado triste com a cosmologia
ela disse que o universo se expande e o espaço entre nós aumenta
espero que tudo seja mentira
4 bilhões de quilômetros já bastam
até pensei em pedir à marte para trocar de lugar com você
se demorar eu farei uma ponte einstein-rosen
tudo bem, eu sei que daqui a pouco você vem
ei netuno,
enquanto você não chega
peguei uns filmes para sonhar contigo
las von trier é foda! mas netuno, você é mais!

EGO-ECO no Jornal Plástico Bolha

http://www.jornalplasticobolha.com.br/pb32/texto27.htm


PIOLHO, REVISTA DE POESIA

Uma sebenta que circula de mão em mão
Nesse charco que É o POEMA
COM NOVE BURACOS
QUE SANGRAM escárnio e maldizer
nesta época em que os poetas
e crepusculizam

António S. Oliveira




2.3.15

METRONIDAZOL

“o azul apenas mostra a aparência das coisas”

walter benjamim

uma caixa de lápis de cor com trinta e seis cores
poderiam ser trinta e seis poemas
trinta e seis perfumes coloridos
trinta e seis armas de amor
são trinta e seis caminhos
para se chegar a um buraco negro
trinta e seis rotas de colisão
trinta e seis saltos de voo livre
com apenas um lápis eu perfurei o ventre
com apenas um lápis de cor azul
poderia ter escolhido o lápis carmim
trinta e seis formas de morrer cinematograficamente
trinta e seis cores para pintar a montanha de jodorowsky
mas escolhi apenas um lápis de cor azul
foi tenso, foi intenso
trinta e seis cilíndricos artistas malvados
de todos os tipos e más intenções
carmim, vermelho vivo, vermelho denso
vermelho cor de caqui pintado
vermelho boca aberta boca grande
tomei flagyl não pela perfuração no ventre
tomei para revestir o estômago de azul

1.3.15

TEORIA X

de fato
a cosmologia poderá nos explicar o nascimento do universo
do mesmo jeito que explica o controle da gravidade sobre nossos corpos
até o ponto de colidirem
a partir da colisão nada se explica
o fenômeno ainda é desconhecido pelos cientistas
quando dois corações colidem
propagam verdadeiros “tsunamis” gravitacionais
nem beuys previu em terremoto no palácio
tamanha energia propagada
os padrões vibratórios são frenéticos
astros se formam a partir da agitação das partículas
oscilações de luz ocorrem nos olhares com muita frequência

e os movimento dos corpos no espaço se tornam imprevisíveis

14.2.12

ÚRSULA


A ursa úrsula era rosa
A ursa úrsula morava num ursário
A ursa úrsula era filha de um urso e uma ursa
A ursa úrsula tinha seda correndo em seus pelos de seda
A ursa úrsola andava fora de moda
A ursa úrsola era retardada
A ursa úrsola vertia sangue frio no inverno
A ursa úrsola mascava chiclete fofo
A ursa úrsola sonhava em ser um urso de pelúcia
A ursa úrsola lia muito dostoiévski
A ursa úrsola era parecida com ela mesma
A ursa úrsola se chamava sapo fora da lagoa
A ursa úrsola não era uma ursa
A ursa úrsola não pagava suas contas
A ursa úrsola se suicidou